fabricando

como se tivesse 8 anos

September 26, 2018 · Leave a Comment

O processo de buscar julgar menos é tão complexo, tão difícil. Precisa de um empenho enorme, além de paciência sem fim pra lidar com UM MUNDO de julgamentos sem intenção (mas ainda com impacto).

 

E dá um trabalho danado desfazer alguns estragos que parecem pequenos mas quando acumulados nos anos ficam imensos.

 

Enquanto fazia a tarefa de hoje, que era interpretar um texto sobre ecologia, Otto me diz que escutou na escola, enquanto falavam do impacto humano na natureza, que “quando damos comida aos animais silvestres, eles ficam PREGUIÇOSOS” e por isso não é boa ideia dar comida pra eles.

 

Animais preguiçosos. Pode até ser que a palavra seja adequada pro que acontece na prática, mas coloca um julgamento também, como se a “culpa” fosse do animal, como se ele escolhesse conscientemente não mais buscar comida.

 

Fui ler o texto, que dizia que os animais DESAPRENDEM a procurar comida na natureza, deixando-nos vulneráveis, e que isso é prejudicial.

 

Caramba, olha que explicação legal? Otto inclusive começou a perguntar sobre o que era desaprender, e  se escreve com hífen ou sem. Ele quis saber o que acontecia se tivesse pouca comida e os animais fossem muitos. “Eles vai brigar!” — ou vão dividir; ou vão buscar mais. “Eles encontram uma maneira”, expliquei.

 

Tive que conversar com ele pra dizer que não é que o animal fica preguiçoso — ele busca comida onde é mais fácil, e pode depois não saber (esquecer, desaprender) onde deve buscar. Que é importante que eles saibam procurar a comida e não dependerem dos humanos.

 

Fico me perguntando se as pessoas julgam (qualificam ou categorizam de forma extremamente simplista) porque lhes falta repertório pra entender a complexidade da vida e das coisas, sabe?

 

Dá trabalho, e requer PENSAR, pra explicar coisas de forma que uma criança de 8 anos entenda sem recorrer a qualificações simplistas.

 

Também não quero julgar nem crucificar quem disse isso pra ele na escola, mas eu adoraria que as pessoas tratassem meu filho (e crianças em geral) como pessoas que pensam e têm capacidade de entender ideias complexas, apesar de serem crianças ainda. Ser criança não significa ter capacidade cognitiva menor, só significa que têm menos repertório ainda.

 

Não acochambrem as coisas pra crianças, gente. Só expliquem de forma direta e simples, e deixem elas perguntarem.

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