abençoadas incoerências

eu gosto mesmo de mudanças e renovação, não é da boca pra fora não. por exemplo: ontem gastei muitos dinheiros em algumas camisas novas (roupa de trabalhar), eu estou realmente precisando. a conseqüência imediata é que não me aguento de vontade de ir pro guarda-roupa e separar dúzias de peças pra mandar embora. acho que eu gosto mais de me desfazer de roupas do que comprá-las, por mais maluco que isso soe. adoro trocar de emprego, de projeto, de resposabilidade. adoro estudar e aprender coisas novas, mudar de idéia.

mas aí eu vi em algum lugar (algum blog que visitei, já esqueci, eu fico pulando de um link pro outro) o site pandora, que diz que apresenta pra você músicas novas mas que são relacionadas ao seu gosto, coisas que você potencialmente gostaria.

a idéia é genial, não é? pois é, mas eu não me interessei nem um pouco. aliás, resisti na hora, o primeiro pensamento que veio foi “eu estou feliz com as coisas que escuto, e nem consigo ouvi-las todas. pra que mais?”. auto-analiticamente, como sempre, percebi que resisto ao novo em 2 áreas bem específicas: música e leituras. sou fiel ao que já gosto e principalmente aprecio o conforto de ouvir e ler coisas que conheço bastante bem.

poucas coisas me dão tanto prazer quando reler um livro que já li mil vezes e reencontrar paisagens, personagens, descobrir novas coisas em histórias pra lá de conhecidas, explorar partes do enredo que nas outras vezes deixei um pouco de lado, pensar em tudo de novo, com minha consciência e informação de agora (porque a gente muda, e quando lê de novo um livro, é outra pessoa lendo).

ouvir canções ou peças que conheço de cor também me trazem essa sensação de conforto, de casa, mas é melhor que isso: é a segurança e estabilidade da minha casa interna, que não depende de onde estou fisicamente. é como reencontrar seu quarto de infância e olhar, com olhos de adulto, seus brinquedos e coisinhas, lembrar de quem você já foi.

não digo que não tento as novidades em livros e músicas, até porque minha curiosidade é maior que minha resistência, mas tanto em literatura quanto em música há atualmente uma quantidade assustadora de oferta e novidade. notei que em relação à música (talvez graças à imensa oferta de novidades) há mesmo um hype em torno do que é desconhecido-pela-maioria. quero dizer: se é desconhecido, é in. ficou conhecido? é out.

acho que minha resistência com tanta novidade tem um pouco disso também: essa óbvia necessidade de se sentir parte de um grupo de poucos e ser connoisseur em qualquer coisa me irrita. lembra um pouco a adolescência e sua vontade desesperada de mostrar que é diferente dos outros, que é especial. considerando que minha adolescência já ficou pra trás há pelo menos 16 anos, fico tranqüila com esse não-desejo de descobrir coisas que ninguém mais conhece, é provavelmente um sinal de que achei meu lugar no mundo.

mas tá, admito: os moderninhos-profissionais realmente me irritam, principalmente porque são vazios e bobos. dou um exemplo bem concreto (pode copiar e testar, é legal). na época em que eu estudava no mesmo lugar que o marido dela, fazíamos às vezes uma brincadeira com nossos amigos metidos a vanguarda: no meio de uma conversa séria, invente o nome de um músico, banda, escritor, artista (qualquer coisa assim moderninha), comente sobre sua obra, e sobre sua influência X, Y ou Z (quanto mais adjetivos sem sentido melhor) e pergunte aos colegas de mesa de bar “vocês conhecem o [coloque aqui o nome inventado], NÉ?!”, com um ar que diz “nossa, se não conhecem, estão POR FORA!”. não houve uma só vez que pelo menos um da mesa não afirmasse que conhecia sim, que achava interessantíssimo, embora não conhecesse muito.

mas voltando: eu falava de gostar de novidades e mudanças (adoro) e de como, paradoxalmente, resisto a novidades musicais e literárias. pode ser só um reflexo da idade, mas no fundo acho que sempre fui assim: muito envolvida pelo meu mundo interior, que é composto basicamente de fantasias e fundo musical. o restante é só matéria, fica do lado de fora e exatamente por isso é fácil de mudar e trocar, é passageiro e fluido. tudo o que afeta o meu mundo interior — histórias, idéias, música, arte, sentimento, sensação — realmente precisa de tempo pra ser digerido e eventualmente incorporado.

mas (que coisa interessante! eu descubro coisas enquanto escrevo :D) acabei de lembrar de outro aspecto da minha vida em que prefiro redescobrir e explorar do que procurar pessoas novas: o sexo. diferente de muita gente que conheço, eu realmente me realizo mais quanto maior for intimidade e ligação afetiva com o outro. não me interesso por sexo casual ou com desconhecidos, não pela questão moral ou ética, mas porque estes serão sempre seres alienígenas ao meu universo interior e portanto não me despertam interesse. sexo pra mim só funciona se houver envolvimento, se o alguém em questão já conseguiu se infiltrar no meu mundinho. se não for assim, com mergulho de cabeça, eu não vejo muita graça.

muito prazer, meu nome é inconsistência 🙂

0 comments to “abençoadas incoerências”
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  1. Costumo me apresentar como uma especialista em generalidades … rsrsrs A maior parte da informação com a qual eu lido é descartável como uma blusa barata depois lavada três vezes. O que sobrevive eu guardo. Acho que, de uma maneira ou de outra, é dessa matéria que todos somos feitos … Xiii … acordei filósofa hoje … rsrsrs Passei aqui só para deixar um “oi”! beijo você.

  2. É como está escrito no topo dum blog por aí, que também não lembro direito onde foi, e que copia de um escritor desses que não é hype porque é famoso: “… Quem faz sentido é soldado.”

    [a frase está incompleta, tem um raciocínio no começo ou no fim, sei lá, mas esse pedaço é que que interessa]

    😉

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