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sujeito-verbo-predicado

September 14, 2012 · 8 Comments

o otto vem arriscando frases aos poucos, do jeito perfeccionista dele, mas normalmente ele fala de si mesmo na terceira pessoa (o otto quer, o otto pegou), e chama cada um pelo seu próprio “título”: a tia paula, a mamãe, o papai, etc.

o jeitinho dele montar as frases é um caso à parte: sempre muito lentamente, saboreando cada palavra e quase podemos ver os neuroniozinhos trabalhando pra articular as coisas “direito”. isso porque não ficamos corrigindo o menino, a gente no máximo repete o que ele fala do jeito certo, sutilmente, por exemplo: ele diz “venhanta, mamãe!” e eu repito “ah, é pra mamãe LEVANTAR?” e assim vai. eu em especial tenho uma preocupação em deixá-lo se arriscar, tentar mais, já que ele é tão contido.

e essa semana ele me pegou de surpresa, com uma frase tão completa, corretinha e cheia de significado. todo dia tomamoa banho juntos na banheira, eu e ele, antes de dormir. nesta hora, entre 18:30 e 19:00 começa o ritual de preparação da hora de dormir. ele adora a hora da banheira — corre pra ver a banheira enchendo de água, joga os brinquedos dentro, “ajuda” (aham) a pegar pijama, fralda, escova de dentes, água, etc.

pois entramos no banho os 2, ele sempre comenta que a água “tá quente”, e começamos a brincar. nesse dia ele sentou e olhou bem fixo pra mim (eu já pude “ver” a cabecinha dele funcionando, antes dele começar a falar, pela carinha) e disse, bem pausadamente:

“eu gosto de tomar banho com você!”

eu sorri, abracei ele e disse que gostava muito de tomar banho com ele também. e comecei a rir muito, porque a carinha dele foi tão engraçada, e a frase tão certinha! e comecei ao mesmo tempo a chorar, emocionada, porque me dei conta que ele tinha dito EU e não “o otto” e VOCÊ e não “a mamãe”. e, é claro, porque pela primeiríssima vez ele estava expressando verbalmente seu apreço por mim, pela minha companhia.

quão incrível é poder presenciar tantas primeiras vezes na vida de alguém?

a emoção de ver um ser humano distinguir a si mesmo do outro, e expressar seus sentimentos em palavras escolhidas por ele mesmo, é imensa. é claro que ele expressa seu amor de muitas outras formas, como só as crianças conseguem. me sinto muito amada por ele, várias vezes por dia. mas essa expressão de gostar da minha companhia foi emocionante demais pra mim. mais emocionante que o nascimento dele, andar ou mesmo falar a primeira palavra.

há coisa mais incrível e humana que se comunicar?

**

e pouco tempo depois dessa experiência intensa, leio esse lindo artigo (em inglês) sobre “as últimas vezes” dos nossos filhos. e chorei, chorei, porque é tão verdadeiro e a gente simplesmente não se dá conta.

ele fala sobre o quanto valorizamos as primeiras vezes (como essa minha história) e esquecemos das últimas vezes. por exemplo — quando será a última vez que o otto vai pedir para dormir na cama junto conosco? quando será a última vez que vai pedir “denguinho” (abraço apertado, no colo) pra mamãe e pro papai?

as crianças crescem, as fases mudam, e todos os dias deve haver uma “última vez” sem que a gente perceba. na ânsia da próxima novidade, do próximo “marco de desenvolvimento”, deixamos de viver este momento incrível e, aliás, único de fato existente, que é o presente.

o passado não existe, é só lembrança; o futuro é um sonho. mais, muito mais, vale a vivência de agora. seja num abraço, numa frase incompleta, no riso e no choro, no cansaço. o sono deste imediato instante é mais valioso que as tardes preguiçosas de anos atrás e que as férias no fim do ano.

e é verdade: para cada fase e momento que eu desejei ardentemente que acabasse há alguma coisa que eu sinto falta.

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8 responses so far ↓

  • Danielle // September 17, 2012 at 2:56 pm |

    Nossa! Me segurando pra não chorar também aqui no trabalho! 🙂
    O Luca está na mesmíssima fase, e é muito lindo ver o progresso diário na fala, na concatenação das ideias… Quando queria suco, alguns meses atrás, ele dizia “tuto!”. Depois “cuco”, depois “máizi uco”, agora diz “qué mais tuco de uva”, “no qué mais tuco de uva”. Da semana passada pra cá, começou a usar preposições… é tudo muito lindo. Já sinto falta há tempos de quando ele mamava, de quando dormia no meu colo… Desde 1 ano e pouco, só quer dormir na cama. Mas são pequenas coisas que se vão e outras que vêm. Agora está cantando um monte, às vezes me acompanha quando canto pra ele dormir, ou “pede” alguma música (começa a cantar: “se essa rua, se essa rua…”; aí eu começo a cantar e ele para; era só pra me “dar a ideia”, acho! :)).
    Experiência impagável, não é mesmo?

    • zel // September 17, 2012 at 3:51 pm |

      é muito incrível. e cada pequeno avanço é milagroso. usando uma frase bem clichê, é ver a vida se desenrolar diante dos nossos olhos, mesmo. estou impressionada como é legal! beijo 🙂

  • Danielle // September 17, 2012 at 3:07 pm |

    Sobre as “últimas vezes”, uma amiga já havia me alertado: aproveite muito cada momento, cada gracinha. Registre, anote, fotografe, pois meu filho já fez algumas coisas fofas, muitas vezes num determinado dia, e depois nunca mais!
    Quanto ao “fazer dormir no colo”, de que sinto muita falta, lembro de curtir muito ele dormindo no meu colo, aconchegado, entregue, quando era bem pequenininho, e eu chorar de saudades antecipadas (podem me chamar de carente, sou mesmo!) 😉

    • zel // September 17, 2012 at 3:52 pm |

      hahahhahahhha! eu não tenho essa carência, não, tou mais pra ficar pensando no próximo marco. mas devia curtir mais o agora, e foi legal ler esse texto pra me lembrar disso, viu?

  • Claudia // September 18, 2012 at 7:04 pm |

    Eu já sou avó da Amandinha.
    Então, curto mais uma vez todas as primeiras vezes e todas as últimas.
    E apesar de ser tão igual a mãe dela, Ana Paula, meu bebê nº 1, é tão absolutamente diferente e tão maravilhoso quanto.
    Juro que nunca pensei que ser vovó era tão bom, Zel !!
    Leio tudo o que escreves sobre o Otto, desde sempre.
    E me emociono, como se te conhece de longa data.
    Abraços carinhosos e até o próximo post, que espero que não demore…

  • Mariangela // September 19, 2012 at 2:07 pm |

    Que texto lindo Zel,temos que curtir mesmo,e valorizar e nos emocionar com estes momentos,eles crescem em velocidade vertiginosa e depois nos ficam as doces lembranças.Hoje senti uma alegria muito parecida ,minha filha(14) voltou da escola e me contou numa felicidade imensa que vão fazer uma “máquina”,uma engenhoca que funcionará ,e empolgada me detalhava como serão os detalhes e cálculos todos deste “robô” que fará com o amigo de classe.Em um breve momento me vi assim empolgada nas feiras de ciencias de minha escola nesta idade que ela tem hoje…A gente vê as criaturas crescendo e se enchendo de autonomia e atitude e a sensação é gostosa demais,a verdade é que nos realizamos e muito a cada conquista emocional e intelectual deles.Um beijo querida!

  • Mari Oliveira // September 20, 2012 at 3:39 pm |

    Zel, aquele livro que comentei no post anterior, O “Maternidade e o Encontro com a Sombra”, de Laura Gutman, diz que quando a criança passa a dizer “Eu” em vez de “Seu Nome” é quando começa o fim da simbiose mãe-filho, que vai desde o útero até uns 2 anos (idade do Otto, né?). Diz que a criança não se entende como indivíduo até então, que ela acha que ela e a mãe são uma coisa só, por isso diz (no seu caso), Otto fez, Otto vai.
    Quer dizer então que seu filhinho já se enxerga como um, e você como outro.
    Que emoção! 🙂

    Um beijo!

    • zel // September 20, 2012 at 3:42 pm |

      mari, eu não li o livro ainda, mas percebi isso no momento em que ele falou! acho que por isso fiquei tão emocionada. como é lindo ver um ser humano ser ele mesmo, descobrir seus caminhos, seus gostos e tal. muito incrível e bonito. adorei. beijo 🙂

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