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a experiência antropológica mais completa

January 27, 2014 · Leave a Comment

A Maria, nossa mais que querida funcionária que é mãe-avó-amiga-babá-etc. agora está com um problema pra sair com o Otto e passear no condomínio: ele só quer andar pelado. No meio do passeio ele decreta “tou com calor, vou tirar a roupa!”

Com muito custo ela convence o menino a pelo menos vestir uma cuequinha (ele cedeu sob protestos, parece), e ele anda de cueca pelo condomínio.

Pra além da graça toda da situação, e o fato dela agora chamar o menino de “curumim” , fiquei pensando no quanto a nudez é tabu. Ele e nós andamos sem roupa na casa com frequência. Eu inclusive ando sem roupa até quando temos visitas (evito quando tem homens, por pura convenção social), não tenho vergonha nenhuma.

Quando adultos, respeitamos as convenções sociais sem nem prestar atenção. Quando criamos uma criança, nós confrontamos com algumas regras que, pensando bem, não fazem sentido algum.

Pra que usar tanta roupa no verão? Por que não podemos andar pelados quando a roupa não serve para proteger? Por que tanto incômodo sobre o que vão pensar sobre nossos corpos?

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E percebo, encantada, que minha maior expectativa em relação a ser mãe se cumpriu: é a melhor experiência antropológica que pode haver.

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rasgando livros e corações

January 27, 2014 · Leave a Comment

estávamos lendo o livro fofo da coruja com o otto (“um tanto perdida”) antes de dormir, e na empolgação de passar a página (a história é cheia de surpresas) ele arrancou um pedaço dela fora, meia página! <o> (mesmo a gente tendo avisado mil vezes, antecipando o ocorrido). minha reação foi espontânea e tão de choque com o livro rasgado (como é impactante rasgar livro, não? que coisa!) que mesmo eu não tendo gritado e nem brigado com ele o menino ficou paralisado, coitado, olhando, mexendo na página rasgada com aquela cara de “OPS!”.

“dá pra consertar, mamãe?” — “dá sim, mas nunca vai ficar igual, meu amor”.

continuamos a história, mas ficamos todos meio chateados. acabou, guardou, vamos dormir, beijos, abraços, etc. a gente sempre dá a opção de escolher quem fica com ele para dormir, e surpreendentemente hoje ele escolheu o Fer (ele SEMPRE quer que eu fique, é um grude comigo nessa hora), e ficou repetindo “você me desculpa, papai?”, com aquela carinha de quem fez bobagem.

AI, GENTE. destruiu nosso coração. a gente não brigou com ele, nem gritou, nem NADA, mas não precisa fazer nada disso pra criança perceber que algo errado aconteceu, e tentar consertar. e convenhamos, é só um livro né?

o que reforça pra mim 2 coisas:

1) nenhuma criança precisa apanhar. a gente consegue transmitir a mensagem, eles entendem TUDO!

2) é preciso todo cuidado, amor e respeito do mundo ao lidar com crianças. elas sentem demais a nossa decepção, raiva, medo, apreensão, tensão, etc.

o Fer ficou lá, e eu vim aqui terminar um trabalho pra ver se meu coração cresce e fica do tamanho normal de novo, que agora ele está do tamanho de uma uva passa.

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gênio pra quê?

January 8, 2014 · Leave a Comment

Pensei tanto nessa notícia — a primeira reação é achar incrível, UAU, que máximo. Mas logo depois pensei: e quando essa criança brinca e socializa? Qual a vantagem de ler tantos livros e não dividir com ninguém? Pra quê contar até 200?

Li em algum lugar a respeito de crianças-gênio que chegam à vida adulta e se tornam simplesmente adultos acima da média, e não transformaram sua capacidade excepcional em nada significativo. E pior — tem problemas sociais.

Por que valorizamos tanto estes marcos e métricas individuais (ler, contar, quantos livros) e tão pouco as habilidades sociais e criativas?

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jardim da infância, ano 1

October 29, 2013 · Leave a Comment

já faz 1 ano que o otto começou na escola, nem acredito. pra nós ainda é tudo novidade, e nem sempre ir e ficar lá são tranquilos, mas tenho certeza que essa atividade é importante pra ele.

hoje fomos à reunião periódica com a professora da turma, e foi muito legal aprender um pouco como sobre ele se comporta quando não estamos junto. algumas coisas são exatamente iguais — a tendência de observar muito antes de tentar qualquer atividade, preferência por brincadeiras com poucas crianças e sem muito barulho, a tranquilidade e educação ao falar com as pessoas e explicar o que quer e não quer, todo o jeitão analítico bem caraterístico dele.

mas nos surpreendemos com coisas que ele só faz na escola, como por exemplo perguntar se pode levantar da mesa, se pode começar a comer, se pode pegar coisas que não são dele (nunca fez isso em casa, quem me dera!). soubemos que ele gosta de contar histórias para os amiguinhos, mas que conta com suspense, entonação, do início até o fim, perfeitamente, ao ponto de causar espanto. e que uma das brincadeiras que ele mais gosta é cuidar das bonecas e dos amigos menores, com a maior atenção. nunca imaginamos!

a professora fez piada chamando ele de “pequeno imperador”, dizendo que ele sabe muito bem o que quer e o que não quer, e expressa isso verbalmente sem o menor problema. e que DIRIGE os outros, inclusive os adultos, pra fazer as coisas do jeito dele. a minha irmã diz que o menino já nasceu gerente, e ela tem toda razão 🙂

mas a coisa que mais gostamos de ouvir é que ele brinca e se diverte com as demais crianças em atividades conjuntas, diferente do que achávamos (ele nos parece sempre muito isolado quando encontramos com outras crianças). só que não é qualquer criança — ele gosta de algumas (sempre as mais calmas), e simplesmente sai da brincadeira quando começa a virar muvuca.

e, claro, o apetite incansável e disposição para experimentar comidas e bebidas novas é sempre assunto. disseram que atualmente o problema das crianças no almoço é a famigerada beterraba, que todos querem trocar por outra coisa. menos o otto, claro, que além de comer tudo ainda faz questão de afirmar na mesa “eu ADORO beterraba!”

<3

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como educar para o NÃO consumo

October 23, 2013 · 2 Comments

essa é a pergunta de um milhão de dólares, e para a qual (desculpem) não tenho a resposta. mas tenho minhas reflexões e algumas práticas/fé para compartilhar.

eu consumo muito mais do que devo (ou posso, às vezes) e preciso. acumulo roupas, sapatos, bugigangas, móveis e enfeites, jogos, músicas, filmes, livros. não me engano com o discurso de que algumas coisas são “acervo”. são bens de consumo, são supérfluos, não preciso de 90% do que possuo. mas gosto de consumir, de ter, acumular.

(e não sou, nem de longe, a pessoa mais consumista e apegada que conheço!)

cada vez que faço faxinas na casa me dou conta do quanto eu compro. cada vez que junto o lixo reciclável me assusto com o volume de embalagens que estou descartando. pra que tanta coisa, pra que tanta embalagem?

e sendo assim, consumista, como criar meu filho para ser menos consumista e deixar de querer TER tudo, comprar coisas? é possível na nossa sociedade criar um ser humano que não seja consumista, que seja minimamente blindado contra a propaganda, o apelo de comprar?

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para entender melhor a questão do consumismo e iniciativas de proibir ou pelo menos controlar melhor as propagandas dirigidas para o público infantil, conheçam o movimento infância livre de consumismo.

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acompanho este movimento desde seu nascimento, acho propaganda dirigida a crianças uma coisa execrável, mas sempre fui contrária à intervenção do estado nesta questão. minha lógica é a seguinte: propaganda precisa de veículo, e quem dá acesso a ele são os pais/responsáveis. eliminando o veículo, acaba a influência, certo?

mais ou menos (e por isso cada vez mais acho que seria sim benéfico o estado controlar este tipo de ação de marketing), porque quando a criança é muito pequena é simples “blindá-la”, basta evitar canais de TV e locais de consumo de produtos infantis (parques de diversão, shopping, etc.). conforme a criança cresce e começa a conviver com o restante do mundo fora da sua própria casa, o bombardeio é constante e muito forte. outdoor, folheto, gibi, amiguinhos, familiares, novamente a TV, etc etc etc. quando paramos para prestar atenção a esse assunto, percebemos que somos regidos pelo consumo, o tempo todo. tudo ao nosso redor grita COMPRE COMPRE COMPRE.

nós já estamos embebidos nessa realidade, amortecidos, não percebemos mais (e compramos, compramos, compramos). quando chega um novo humano no mundo e começamos a prestar atenção a esse assunto, é assustador. e avassalador também, é quase impossível evitar a imersão nessa cultura. afinal, precisamos comprar para viver.

precisamos mesmo? é essa pergunta que me faço, e sem entrar em nenhuma onda hippie, que não é meu estilo. não tenho intenção de viver sem dinheiro ou sem comprar. mas venho pouco a pouco (últimos 15 anos) tentando reduzir meu nível de consumo. considerando que meu salário aumentou consideravelmente nestes 15 anos e que continuo gastando praticamente tudo que ganho, fica claro que minha tentativa não é exatamente um sucesso. mas analisando meus gastos, vejo que consumo muito em comida, habitação e… viagens. ou seja — como bem, moro bem e viajo muito, e é aí que vai a maior parte do meu dinheiro (consegui guardar também, pra morar ainda melhor!). já não gasto mais tanto dinheiro em roupas e artigos de luxo pra uso pessoal; mas ainda gasto bastante com transporte (2 bons carros, que nos levam da nossa boa casa pros bons lugares que gostamos de ir) e muito com eletrodomésticos, por exemplo, que poderia reduzir. pouco a pouco, vamos analisando e cortando aqui e ali, focando no que é importante pra nós.

continuo consumindo muito, sim. mas cada vez mais no que é essencial pra mim, pra nós da família. menos “coisas”, e mais vivência (boas refeições, espaço em que convivemos, viagens juntos). chegaremos lá, tenho fé.

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ainda precisamos comprar, sim. não plantamos nossa comida (mas uma parte dela já começamos a plantar), mas preparamos nossas refeições; não construímos nossas coisas, mas procuramos comprar diretamente de quem constrói ou produz; contratamos serviços que não queremos fazer; viajamos de avião, mas também procuramos viajar de carro, dentro do nosso país; os carros ainda são indispensáveis, diante da escolha de moradia que fizemos, mas quem sabe um dia podemos andar a pé, de bicicleta, ou mesmo de moto? uma opção para o futuro.

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com o otto, tomamos algumas medidas que por enquanto têm funcionado bem. conforme ele vai crescendo, o desafio é maior, mas somos criativos e tenho certeza que encontraremos alternativas educativas e saudáveis para lidar com a situação. ele tem 3 anos, e não precisa ainda de “educação para o consumo”. falarei da minha opinião sobre mesada e coisa parecida no próximo bloco.

– não levamos o menino para fazer compras de nenhum tipo, a não ser que seja inevitável. comprar não é “programa”. saímos para comprar somente o que precisamos, e deixamos a criança em casa (ou vamos juntos quando a babá está em casa, ou 1 vai e o outro cuida dele)

– não costumamos falar sobre comprar/ter coisas. procuramos sempre falar sobre usar as coisas, trazer as coisas, emprestar as coisas. por exemplo: “otto, a mamãe TROUXE um presente” (e não COMPROU um presente). pode parecer besteira, mas acho que essa abordagem tira o peso/fetiche da compra

– não falamos sobre dinheiro nem sobre caro/barato com ele ainda, não damos “valor” para nada. e como ele não nos presencia comprando quase nunca, não faz a correlação coisa-dinheiro. se ele vê alguma coisa e quer, e eu considero caro, simplesmente falo que não vamos levar aquilo naquela hora, que aquele item é da loja e fica por lá

não usamos coisas (trazidas ou compradas :)) como prêmio, é simplesmente uma surpresa, um agrado

– não comemoramos dia de mãe, pai nem criança. não damos importância a presentes no aniversário ou natal, procuramos dar mais ênfase ao evento que aos presentes (a festa, a visita dos amigos e família, a comemoração em si). ou seja — no aniversário, sempre falamos da alegria que é receber a visita de fulano, que veio especialmente para o aniversário, e não que o fulano deu o presente X

– fazemos questão que quaisquer presentes pra ele sejam recebidos diretamente por ele, das mãos de quem deu, e pedimos que ele agradeça. consideramos extremamente importante que ele perceba que a pessoa é mais importante que o presente (ou que o presente é importante porque ALGUÉM pensou nele). somos completamente contra o sistema de colocar os presentes num montão, que ele vai abrir depois. até hoje, todos os convidados são recebidos por nós e por ele, e o presente é dado pra ele diretamente

– ele simplesmente não vê TV. só assiste programas no IPad (youtube ou outros), DVDs, NetFlix, tudo sem pausa ou propaganda. ponto final.

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conforme o menino for crescendo, vamos explicar que as coisas custam dinheiro, e algumas coisas custam mais ou menos. vamos tentar usar a quantidade de unidades de medida de $$ para explicar, mas sempre procurando ensinar sobre querer ou não querer trocar o $$ pelas coisas, e se realmente precisamos daquilo ou se é mero desejo.

acho muito importante ensinar que as coisas têm valor monetário, que trocamos dinheiro por coisas, e em especial que o dinheiro é algo que se ganha. muito me incomoda a ideia de mesada por ser um dinheiro dado, e não ganho. ora, se a ideia é ensinar como funciona o mundo, por que alguém simplesmente dá dinheiro a outro, sem trocar por nada?

também me desagrada dar mesada ou dinheiro à criança em troca de tarefas que ela devia fazer simplesmente por ser parte da família/comunidade. não acho certo dar dinheiro em troca de arrumar a cama, ou ajudar na limpeza e organização da casa. isso faz parte das atividades comunitárias. faz mais sentido pra mim ganhar uns trocados por lavar o carro, cuidar do jardim (coisas que normalmente nós aqui pagamos para outros fazerem). ainda não sei como vamos lidar com essa questão. tanto eu quanto o fer fomos crianças sem mesada, nossos pais davam dinheiro para coisas que precisávamos ou queríamos, sob demanda específica, não tínhamos dinheiro “nosso”, pra gastar ou guardar.

entendo a lógica de dar mesada para ensinar a “administrar o dinheiro”, essa é uma habilidade útil na vida. mas acho que ensinar a consumir minimamente e (por exemplo) convidar a ajudar a administrar as despesas da casa  em conjunto podem ser formas alternativas de ensinar (por que não? eu faço tudo numa planilha excel, e posso perfeitamente convidar o otto mais velho a me ajudar, analisar junto. quem sabe até ele aprende a usar planilha cedo? :D)

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como disse no começo — não tenho respostas definitivas, tenho crenças e ideias. os itens que coloquei ali no meio a gente já pratica, e o otto não simplesmente não pede pra comprar coisas, nunca. ele pede coisas — “mamãe, você me trouxe um presente?” ou “papai, eu queria um chocolate!”. mesmo quando vamos aos lugares que têm coisas à venda, ele não pede pra comprar, ele simplesmente “quer”. e aí, ou levamos ou dizemos que aquele ali não vamos levar agora, quem sabe outro dia.

ele não associa natal, aniversário e nenhuma data com o fato de ganhar presentes ou coisas, por enquanto. por outro lado, procuramos valorizar bastante as festas, as pessoas e as viagens. no aniversário dele e nas festas em geral, costumo preparar tudo em casa, e “fazer” presentes pra ele (cartão, álbum, etc.). também peço que as pessoas não tragam presentes comprados, que façam algo pra ele ou mesmo reciclem coisas das suas crianças. quase ninguém faz isso, mas quando fazem é sempre lindo (e já percebi que ele próprio valoriza muito presentes personalizados).

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mas dizia que mudei de ideia em relação ao controle de propagandas, porque a concorrência é mesmo desleal. e as pessoas que não estão tão engajadas quanto nós nessa cruzada contra o consumismo? e os que precisam da TV como babá pra ter 1h de sossego e cuidar da casa, da vida? e as mães e pais solteiras/os, que precisam levar seus filhos onde vão porque não têm com quem deixar? e quando ele ficar na casa de amigos, ou não estiver numa escola tipo waldorf como o otto?

precisamos de toda a ajuda que tivermos. é sim nossa obrigação como educadores ensinar nossos filhos a ser menos consumistas, e acho que todos os esforços devem ser feitos. mas se não tivemos alguma ajuda, a tarefa fica hercúlea e muito estressante para os pais.

então, continuarei investindo nestas pequenas ações cotidianas e também apoiarei ações maiores para ajudar o mundo a ser menos consumista. no que depender de mim, o otto será muito menos consumista do que eu fui/sou.

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nem príncipe nem plebeu

September 20, 2013 · 2 Comments

desde que o otto começou a falar, e se comunicar bem com a gente, procuramos sempre conversar, negociar, explicar tudo o que fazemos com e para ele, o também o que ele pode e não pode fazer. quando conversar não funciona, usamos o “castigo” — fazemos um “time out”, sentamos com ele no quarto dele num banquinho pra “pensar no que aconteceu” e falar sobre isso. ele não gosta (a menos que queira nos contrariar, aí ele QUER ir pensar), mas o resultado geralmente compensa, pois ele se acalma e falamos sobre o que não deu certo, não foi legal, etc. e ele geralmente sabe direitinho o porquê do castigo ou da bronca.

educar o otto tem me feito repensar uma série de coisas no meu próprio comportamento, porque me peguei repetindo frases que minha mãe dizia quando eu era criança, e que eu odiava. percebi também que eu dizia pra ele coisas que detestaria que dissessem pra mim! resolvi então fazer um exercício difícil, mas importante: me colocar no lugar dele quanto ao que digo e exijo. a ação, a frase, as palavras, o tom, tudo.

por exemplo: “otto, PARA de bater essa colher na mesa, AGORA!”

(frase dita com os devidos grifos, depois de minutos de batuque incansável que estavam me causando uma enxaqueca)

me imaginei na cozinha, batucando com meus talheres, alheia ao barulho (ou até curtindo, sei lá), e alguém muito maior que eu, mais forte, do qual eu dependo e a quem eu amo, falando essa frase assim, do nada. em tom agressivo, e (pelo menos pra mim), sem nenhum motivo. eu tenho absoluta certeza que ia ficar com medo, ou com raiva, ou ambos.

e ao me colocar no lugar dele, veio uma enorme pergunta que independe do medo, raiva, ou surpresa: por que eu deveria parar? só porque alguém grande e bravo (e que eu amo, a propósito) pediu ou mandou?

fiz também um outro exercício: se o otto não fosse meu filho, ou nem fosse uma criança. eu falaria do mesmo jeito, a mesma coisa? não, é claro que não. então por que com ele eu falo e faço assim?

porque por trás da relação adulto/criança e filhos/pais tem a sombra enorme da obediência. e obediência não é respeito, a obediência é baseada na hierarquia, no medo, ela é burra. ela pressupõe uma relação de poder, completamente desigual.

eu ODEIO obediência. eu não acredito nela, nunca acreditei, eu C&A* para hierarquias, e nomes, e títulos. não faz sentido algum eu continuar baseando minha relação com meu filho neste conceito estúpido.

concluí: não quero que meu filho me obedeça. nunca. prefiro mil vezes que ele desobedeça, que questione, que seja um mala-sem-alça, revoltado, chato de galocha. obediência é uma coisa triste.

e mais — tive que ter discussões importantes com o Fer, pai da criança e meu companheiro, a respeito disso. ainda não tenho certeza que ele entendeu meu ponto (tomara que esse texto ajude!), mas combinei com ele: jamais, nunca, dizer coisas como “você não OBEDECEU a mamãe, e por isso <X>” ou “você precisa obedecer a mamãe!”.

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mas às vezes a gente precisa que a criança obedeça, não? e aí? olha, eu prefiro adotar o verbo COLABORAR, e vou explicar o porquê, não é neurolinguística amadora.

nossa função é educar a criança, ensinar a ela as regras de convívio, a empatia, etc. (com sorte, essa é a função de todos os adultos que cruzarem o caminho dela). a coisa mais básica (e difícil, eu sei) que ele precisa aprender é que existe um limite, físico e social, entre ele e as outras pessoas todas. que se ele não olhar pra onde pisa, vai pisar no meu pé e aprender empiricamente que dois corpos não ocupam o mesmo espaço ao mesmo tempo; que quando ele grita, o som chega até meus ouvidos e me incomoda; que se ele deixar um brinquedo no chão, atrapalha a passagem das pessoas. enfim, vocês entenderam. e como fazer com que ele entenda isso, e aprenda a respeitar os limites alheios?

com uma paciência do tamanho do mundo, e parando pra questionar certas coisas, com franqueza.

me perguntei: por que eu respeito os limites alheios? por medo, covardia, porque não quero confrontar. porque não quero chatear a outra pessoa. por preguiça de me impor. porque quero agradar.

e como tomamos essa decisão, de respeitar, ou de colaborar? como aprendemos isso? errando e acertando. o que significa, na prática, que lidando com as consequências do que fazemos aos outros, aprendemos com o erro/acerto, e lembramos do que queremos repetir ou evitar, criando um padrão de comportamento.

consequência é a palavra-chave. as crianças aprendem a respeitar por medo, sim, aprendem que se forem obedientes, não serão punidas. mas eu não quero criar uma criança que me respeita por medo, poxa. eu quero que ele seja rebelde 🙂 um rebelde respeitoso! e tenho certeza que isso é possível, se eu conseguir mostrar claramente as consequências do que ele faz, e se eu mostrar pra ele que eu o respeito, e que quero o mesmo tratamento de volta. é uma troca, e não uma obrigação. o respeito e a colaboração têm relação com o interesse mútuo e (com sorte), com amor.

então, ao invés de dar um grito de “não pisa no meu pé!” quando ele pisa, eu tenho explicar que eu também sinto dor (será que ele sabe? sempre pressuponho que não. e ensino), que quando ele pisa no meu pé, dói, e eu não gosto. ele puxou meu cabelo outro dia, e pedi que parasse, expliquei que doía, etc. ele continuou. eu tentei diferente — mostrei que nós 2 temos cabelos. puxei o dele, de leve, mostrando que podia doer. avisei que para cada puxão no meu cabelo, eu daria um igual no cabelo dele. e assim foi, até que doeu, ele chorou, e parou de puxar meu cabelo. e agora, quando ele puxa sem querer e eu aviso, ele para imediatamente.

o exemplo do cabelo é mais fácil de demonstrar ação/consequência. algumas coisas são mais difíceis, por exemplo: ele começou há alguns meses a ignorar perguntas. ele ouve, mas não responde. estamos ensinando que ele pode dizer que não quer conversar, é direito dele, mas não pode não responder, simplesmente. por quê? porque vivemos em grupo. é uma regra razoável numa comunidade — você pode não querer conversar, mas não pode não responder à pergunta “você vai querer jantar?” porque isso impacta a comunidade. usar a tática de fazer o mesmo com ele não funcionou muito bem por enquanto (ignorar perguntas e conversas), embora eu tenha tentado fazer isso às vezes para que ele sinta qual é o problema.

procuro sempre mostrar pra ele que precisa parar de fazer certas coisas (espirrar água em mim no banho, por exemplo), porque eu não gosto, e não quero. também acho essencial ensinar pra ele que todos temos direito a não querer que invadam nosso espaço físico, que nos toquem, machuquem, incomodem. que precisamos ouvir o outro, prestar atenção ao que estão pedindo. (e sempre que possível, respeitamos a vontade dele. acho que isso ajuda muito neste processo)

em cada pequeno exemplo destes, o que estou ensinando é como colaborar conosco pra que nossa vida juntos seja mais legal, mais tranquila, e até possível às vezes. quero que fique claro que ele é MAIS UM na nossa comunidade, e não o centro dela. ele precisa colaborar conosco, com as coisas que nós também precisamos ou queremos fazer, como por exemplo dormir um pouco mais no fim de semana. eu quero dormir, ele quer ver desenho — ele fica com o ipad, mas às vezes quer que eu fique junto. e eu explico: até as 8h a mamãe vai dormir, e você pode ver o seu desenho. depois brincamos juntos, mas agora, nesta 1h, eu quero fazer outra coisa.

a boa notícia é que cada vez mais isso tem funcionado!

e assim vamos, ensinando as menores coisas, aquelas todas que a gente fazia no automático. e quer saber? é bom. porque a gente aprende muito quando ensina, e aprende inclusive a mudar a si mesmo em coisas que estavam enraizadas e cheias de musgo. crianças obrigam a gente a fazer uma faxina na mente e na alma.

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quando preciso que ele faça alguma coisa, sempre explico o porquê. e quando o que precisa ser feito não tem negociação, no entanto, faz-se à força. e explico sempre: “você podia ter colaborado, a gente não precisava brigar. mas isso PRECISA ser feito, então vamos lá”. trocar fralda de cocô que já passou do prazo, ir dormir, colocar cinto de segurança, sentar direito na cadeira pra não cair, essas coisas e muitas outras. comer não é uma delas, no entanto. comer, só quando se tem fome (mas os horários da casa são respeitados, nada de refeição fora de hora — regras da comunidade :))

não gosto de falar até a orelha cair. explico 1, 2 e no máximo 3 vezes. sei que crianças não absorvem tudo de uma vez, assim, pá-pum, ok. mas se não colaborou depois do papo, vai à força mesmo, paciência. de novo — consequências. ele sempre tem a opção de nos ajudar, de perguntar, de fazer JUNTO. se não colabora, a comunidade decide 🙂

porque é isso — não quero obediência, deus me livre de criar um menino vaquinha de presépio, mas ele também não é o príncipe herdeiro, não senhores. ele é parte da nossa comunidade, essa pequenininha da nossa casa, e da comunidade maior da família, amigos e escola, e cada vez o círculo dele vai se expandir mais. a cada círculo, ele vai ter que aprender como lidar com limites diferentes, demandas diferentes, e muito menos paciência que a nossa. não farei bem algum a ele sendo condescendente, então procuro ter empatia porém sem exagero.

crianças são tiranas, todas elas. as pessoas falam “ai, meu filho tem personalidade forte, sabe?” como desculpa para falta de educação. minha senhora, todas as crianças têm personalidade forte, é parte do desenvolvimento neural do ser humano, não existe criança bovina. se ela for bovina, algo está errado. cabe a nós, como educadores, ensinar às crianças que há outras pessoas — com quereres e gostares diversos — no mundo, e que elas são parte do mundo, iguaizinhas às demais pessoas.

eu que não vou criar um ser humano mala geração Y!

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sim, o progresso é lento, e às vezes enche o saco. mas vale a pena, quando a gente vê aquele ser tão pequeno sendo razoável, estando atento às pessoas ao seu redor, e já negociando como fazer o que ele quer através e junto dos outros. integrado à comunidade, pouco a pouco, e não um reizinho cheio de vontades ou uma criança pequena que obedece por puro medo.

pra quem pergunta das coisas legais de ter um filho, essa é uma delas — ver um ser humano decente sendo criado, do zero. fabricado, desde as células até o comportamento e flexão verbal. é absolutamente mágico e incrível.

(e cansa pra caramba)

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(*) C&A = cago e ando. ou cagando e andando.

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leituras interessantes via facebook

May 28, 2013 · 1 Comment

o facebook tem se mostrado uma ferramenta muito legal para obter informações sobre educação, além de ser divertido 🙂 então aproveito para compilar alguns links legais sobre o assunto aqui do blog. enjoy!

pedagogia waldorf e a escolarização precoce

como conversar com meninas

 

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criando um gourmet

March 12, 2013 · 4 Comments

o título é uma piada, é claro, porque eu jamais faria esforço para criar um gourmet. não por nada, é que acho uma bobagem sem fim chamar culinária de arte. cozinhar é viver. e meu interesse principal é mostrar ao meu filho (e a quem me acompanha nessa vida, sempre que possível)  que comer é legal, divertido e gostoso (além de necessário). e que não é preciso tantos aditivos e subterfúgios pra realçar alimentos, eles são ótimos quando puros (crus ou não).

tenho escrito bastante sobre alimentação do otto desde que ele nasceu. no seu primeiro aniversário fiz questão de fazer um bolo bem lindo e diferente eu mesma (nada contra quem compra bolo do filho, ok? mas pra mim isso é importante, e faço questão de preparar eu mesma como parte do processo de comemoração). no aniversário de 2 anos, fiz questão de fazer todas as comidas servidas na festa em casa, com a ajuda das avós, amigos, tios e tias.

o processo de elaboração da comida (começando pela decisão do cardápio, passando pela preparação e arrumação na mesa) é uma das coisas mais deliciosas das comemorações. há uma quantidade enorme de amor nessa preparação, escolha de ingredientes, em todos os passos. não é só comida que se mastiga e engole, é a camaradagem na cozinha, as brincadeiras durante a preparação, a mesa sendo arrumada, o resultado final, a conversa sobre o resultado.

e assim também é no dia a dia — comer é socializar, interagir. dar de comer é cuidar, e amar. a comida do otto sempre foi feita com cuidado, técnica e amor, seja por mim ou pela babá dele, que tem com a comida a mesma relação que nós da casa. talvez por isso ela esteja trabalhando tão bem conosco há 5 anos, sempre tão bem alinhada com nossos valores. ela e eu começamos o processo de alimentação do otto juntas, e ela (com 2 filhos e 1 neta) me ensinou muito também. preparei no papel a lista de alimentos dele quando começamos o processo, experimentei tudo que ele comia, mudamos as combinações conforme a reação dele à comida, e dia a dia apresentamos a ele o maravilhoso mundo dos alimentos. e como resultado, o otto ama comer e experimentar coisas novas!

o otto nunca comeu papinhas industrializadas. comprei uma vez, para testar “na rua”,  como backup (caso ele recusasse a comida feita em casa), mas nunca foi necessário. a verdade é que ele só comeu papinha por 2 meses (até o final dos 7 meses), pois logo que se acostumou com a papinha começamos a dar pedaços de legumes, frutas e carnes (aos 9 meses). e logo que percebemos que ele mastigava, começamos a separar os alimentos bem claramente no prato, e começou a comer arroz, feijão amassado, e tudo o mais. com 12 meses ele comia salada, prato principal e fruta de sobremesa, como um adulto. sal e temperos mais fortes só colocamos a partir dos 2 anos (apesar de sempre ter comido tudo do jeito que era servido quando estávamos na rua). outra coisa que não incentivamos foi tomar suco de fruta, sempre preferimos dar a fruta diretamente (e ele gosta mais). o único suco que damos é de laranja, feito na hora, pela manhã, já que ele não toma leite.

antes de 12 meses, o que fazíamos era levar a comida dele em potinhos, pra onde íamos. e quando possível (faço isso até hoje, aliás), ele almoça antes de sairmos, especialmente quando não temos controle sobre o cardápio. há poucas coisas realmente proibidas na alimentação dele — (*) refrigerante e álcool 😀 — então comer fora não é problema. como em casa ele come de forma muito regular e correta (salada + prato principal + fruta), não nos importamos que ele coma coisas piores nos fins de semana. a verdade é que depois dos 12 primeiros meses de “doutrina” dos alimentos (sem sal, sem tempero, tudo colorido e separadinho no prato, muita variedade) ele não tem medo de experimentar nada, e quer provar de tudo. gosta de variedade, não dá muita bola pra doces (come, mas sem muita fissura) e não se acostumou a tomar líquidos junto das refeições. seguimos a recomendação do pediatra dele de preferir sempre comer a fruta ao invés de tomar suco, e ele acostumou.

hoje em dia ele almoça e toma o lanche da manhã na escola — menu ovo-lacto-vegetariano e orgânico, já falo sobre isso — e toma café, lanche da tarde e janta em casa. sempre comida preparada por algum de nós (pai, mãe ou babá) ou pela cantina da escola, preferencialmente alimentos orgânicos (ovos e frango sempre orgânicos). faço bolo 1 vez por semana, quando o pai toma sorvete ele toma também, quando a mãe quer pipoca ele come também 🙂 e nos fins de semana, comemos o que decidimos na hora.

um dos fatores de decisão sobre a escola que ele frequentaria foi o cardápio de almoço e lanche. nos incomodou demais a quantidade de alimentos que nos recusamos a consumir que são servidos nestas escolas, entre eles: pãozinho “sevenboys”, margarina (!), suco de caixinha, frango e ovos não orgânicos. nada de fruta ou castanhas de lanche, porque “as crianças não comem”.

somos absolutamente contra restrição de proteína animal para crianças. diferente do que muita gente afirma, em especial para crianças, é recomendada a suplementação em caso de dietas vegetarianas. não faz sentido algum pra mim optar por suplementar artificialmente com vitaminas que podem ser obtidas diretamente dos alimentos. entendo a opção de um adulto em ser vegetariano, é válido e legítimo, mas não acho correto impor a mesma decisão (que nem é decisão, afinal) a uma criança. mas vegetarianismo é como religião — não dá pra discutir, porque passa por crença e motivação moral e ética. então falo somente por mim: se meu filho decidir ser vegetariano (ou judeu, enfim), é opção dele, quando tiver discernimento para decidir. privá-lo de proteína animal em sua fase de crescimento por uma convicção, sem ter 100% de certeza das implicações no seu crescimento e desenvolvimento? não mesmo.

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me motivei a escrever este post porque muitas pessoas me parabenizam pelo ótimo apetite e disposição pra comer do otto. e eu acho estranho, porque no fundo sempre acho que esse amor pela comida e pela experiência de comer é inato, é dele. mas pensando racionalmente (e lendo muito do que se escreve por aí sobre hábitos alimentares de crianças), acho que não é só isso mesmo. repensei algumas das nossas práticas alimentares da casa, e acho que têm sim impacto no comportamento dele. e resolvi compartilhar, apesar de não haver comprovação nenhuma e eu não poder garantir que vai funcionar com todas as crianças. mas quem sabe né? tentar não custa.

1) seja a mudança que você quer ver no mundo. você, ou as pessoas que convivem com a criança, são chatos pra comer, não comem de tudo? esqueça. vocês são os exemplos, e não existe o “faça o que eu digo mas não faça o que eu faço”. a alimentação do outro é uma das coisas que é impossível controlar, mesmo quando o outro tem só 8 meses de idade.

2) ofereça o mesmo alimento repetidas vezes, em especial no começo do processo de alimentação. o pediatra do otto sugeriu que servíssemos a mesma fruta por 7 dias, mesmo que ele recusasse, e só então trocasse a fruta. pra que ele conhecesse a fruta, a cara, o cheiro, o gosto, a textura. as crianças recusam tudo que não for leite da mãe, no começo. resistir à mudança é parte da natureza humana, é preciso insistir para ensinar que coisas novas podem ser legais, depois que deixam de ser novas. aos poucos eles aprendem que coisas novas podem ser interessantes (mas continuam recusando no começo. continue oferecendo)

3) nunca insista à força. nunca. essa briga você vai perder. não é possível obrigar alguém a se alimentar de forma consistente. é preciso criar o interesse, e principalmente tornar a hora da refeição um momento agradável, feliz, gostoso. não quer comer? não coma. coma você, mostre prazer em comer. as crianças funcionam por imitação. aconteceu mil vezes do otto não querer alguma coisa, até outra pessoa experimentar — aí ele queria. e amava, e repetia.

4) sempre ofereça muita variedade. as crianças gostam de brincar com a comida, de se divertir enquanto comem. além disso, é importante ter a opção de recusar — se você colocar só 2 alimentos, e ela recusar 1 deles, sobrou só 1. se você oferecer 5 tipos de alimentos e ela recusar 2, ainda sobraram 3. é normal a criança se recusar a comer alguma coisa, faz parte inclusive do processo de auto-afirmação. deixe que a criança tenha a opção de escolher. faça porções pequenas, para não desperdiçar, e pronto (dependendo do caso eu guardo o que ele não quis, e sirvo de novo em outra refeição, e ele come!)

5) a propósito — acostume-se com o não. lide com o não de forma natural, como lida com o sim. a criança precisa sentir que o não/sim têm o mesmo peso, senão a recusa vira arma contra você!

6) não rotule o gosto da criança pela recusa. um “não” não significa que ela não gosta do alimento, mas que naquele momento ela não o quer. quando a gente rotula o gosto da criança rapidamente demais, as opções começam a ficar escassas, e pior, a criança não terá oportunidade de mudar de ideia, porque você não vai mais oferecer! ou pior: vai se convencer (por sua causa!) que ela realmente não gosta de X. policie-se, evite rotular, insista, tente de novo e surpreenda-se.

7) faça pratos bonitos. misture sabores e texturas. não cozinhe demais os legumes, assim que a criança começar a mastigar. mastigar é divertido, e faz parte do processo digestivo. não faça “melecas” misturadas e purês, separe os alimentos claramente no prato. ensine o nome dos alimentos, aproveite a refeição para ensinar sabores (azedo, amargo, doce, salgado, etc.), texturas, cores. não tenha medo de deixar a criança experimentar ardidos, azedos, amargos. elas podem gostar!

8) seu filho não é você. ele pode ter gostos diferentes dos seus, então não limite o gosto dele tomando como base o que você gosta/desgosta. não é porque você odeia melancia (meu caso) que não vai servir para a criança (otto ama). criança não gosta só de doce, não. não tenha medo de dar alimentos crus (sempre limpos e sob supervisão, claro), castanhas, coisas “duras”. ensine seu filho a comer essas coisas.

9) coma junto com seu filho. eles comem melhor quando a gente come, e se interessam pelo que nós colocamos no prato. o otto experimentou cebola crua porque viu no meu prato, quis, experimentou e amou. come todo dia, e muito, se deixar. não existem alimentos “de criança”, eles precisam experimentar de tudo.

10) ensine seu filho a reconhecer os alimentos “in natura”. mostre as frutas, legumes, verduras, temperos (se puder, no jardim ou na horta). mostre os bichos que ele come. mostre ovos, deixe ele quebrar ovos pra fazer bolo, colocar a mão na farinha, experimentar açúcar, sal, canela. comida não é um prato feito na mesa, é um processo. eles amam aprender sobre o processo, e ajudar na preparação. isso cria uma afinidade e interesse pela comida que não tem preço.

11) evite temperos em excesso nos alimentos (sal, alho, cebola, louro, enfim). temperos são coadjuvantes, somente. apreciar o sabor original dos alimentos é maravilhoso, e só é possível se você não mascarar com temperos. dê ao seu filho a chance de saber qual é o gosto do brócolis puro, sem sal nem azeite nem alho nem nada. quando puder mostrar a diferença entre cru e cozido, mostre. é um aprendizado delicioso (inclusive pra você! aproveite a oportunidade pra re-conhecer seu paladar :D)

(update em 25/março/2013)

12) desencane da sujeira. experimentar com as mãos, esfregar na mesa, no prato, no corpo inclusive, faz parte. comer é também um ato sensorial, que a gente afina com o tempo (curte a textura só na boca), mas pra eles é tudo novo. eles ainda não controlam totalmente o movimento fino, então deixe pegar com as mãos, explorar. dê comida num lugar que seja fácil de limpar, e simplesmente coloque as roupas (e o resto) pra lavar depois. mania de limpeza e organização não combinam com bebês 😉

13) não ache que a refeição vai acontecer em 15min. se estiver com horário pra terminar, comece MUITO antes. eles demoram muito mais tempo que a gente pra comer, normalmente, e isso independe da fome. a refeição não é tempo só de se alimentar, mas de explorar, aprender, conhecer, e se relacionar com quem está dando a refeição. se estiver dando muito trabalho ou estiver de saco cheio (enche o saco às vezes, tá?), peça pra outra pessoa ajudar, alternando com você. aliás…

14) mamãe, experimente deixar outras pessoas darem a comida, você pode ter uma surpresa. por conta da nossa ansiedade pra criança comer, ou pressa, ou asco da bagunça, a criança percebe que aquele momento ela está no controle, e usa-e-abusa. muitas das relações de cuidado são quedas de braço entre cuidador/criança, elas estão justamente na fase de aprender sobre controle nos relacionamentos. quebre o ciclo, mude a rotina, e observe como as coisas mudam.

eu teria muito mais pra escrever sobre isso, mas acho que tá bom pra agora. espero que seja útil pra alguém 🙂

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(*) pensei melhor e a lista não é tão pequena. fazem parte dela: sucos adoçados, chocolate de forma geral (ele só come quando a gente come, e é raro), bolacha recheada (dependendo de nós é jamais, em casa não entra), doces “de criança” tipo pirulito, balas, chiclete, salgadinhos de saquinho (nunca são comprados por nós também) estão na lista de no-no. evitarei ativamente que ele coma enquanto for possível. atualmente ele nem sabe o que é bala, pirulito, por exemplo. bolacha ele come, se oferecer, porque de vez em quando compramos um cookies orgânicos, e ele sabe a “cara” do alimento. mas não gosta muito, pra ser sincera. já doritos ele amou (puxou à mãe).

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tantas palavras

January 28, 2013 · 5 Comments

as conversas com o otto estão muito engraçadas, ele definitivamente “pegou o jeito” e está se comunicando muito bem verbalmente. ele não é exatamente tagarela ou extrovertido, mas passa suas ideias com precisão, e usando vocabulário bem interessante pra idade (ou pelo menos é o que nos dizem!)

resolvi neste post juntar algumas das frases/coisas mais divertidas que ouvimos ultimamente, porque as mudanças acontecem tão rápido que não consigo registrar, e quero poder mostrar pra ele quando for maior 🙂

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ele anda apaixonado por fotos, e agora quer fotografar inclusive sua “obra”, os desenhos de giz no chão. “o otto vai tirar foto do desenho”, e fotografa com a maior pose de fotógrafo de verdade.

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o adorado morris lessmore, na interpretação dele, é mézimór péssicor.

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dia desses, bravo porque o pai não queria fazer algo que ele mandou (bem mandão, o menino), ele fala: “o papai precisa obedecer o otto!” (do jeitinho que a gente fala que ele precisa nos obedecer :D)

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provavelmente imitando a maria, babá que cuida dele à tarde, que fala bastante “não faça isso, otto!” numa entonação bem particular e querida, ele repete pra tudo que não o agrada: “não faça isso, mamãe/papai/maria!”. o mais curioso é que ele fala isso inclusive pra outras crianças, que fazem com ele algo que não gosta (como tirar um brinquedo, ou coisa assim). bem sério, sempre mantendo a distância física, um rapazinho comedido.

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o otto quando dá chilique e chora (normalmente porque não damos/tiramos algo que ele quer), entra no modo repetição da mesma frase, como se a repetição fosse mágica e fizesse as coisas acontecerem. “dá po otto, dá po otto, dá po otto!” (em geral 3 vezes), gritando e chorando. sempre repetimos a mesma reação: explicar pra ele que chorar e gritar não funciona, que só vamos evoluir na conversa se ele parar de gritar e chorar.

muitas vezes ele explica (chorando, e gritando): “o otto tá bravo! o otto tá chorando! O OTTO TÁ GRITANDO!”. e nós, segurando o riso (é muito engraçado um serzinho tão pequeno e tão bravo…), mantemos a posição de “gritando não sai coelho desse mato”. em no máximo 1 minuto ele percebe que não funciona mesmo, para subitamente e avisa: “o otto parou.”, pra gente continuar a conversa. e daí geralmente vai bem, ele entende e pronto.

às vezes ele pede colo no meio do chilique (e eu dou, desde que não grite no meu ouvido), percebe que só vamos dar atenção depois que parar, e para. como se não fosse nada. e ainda explica: “a mamãe ficou brava com o otto. o otto chorou.”

<3

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das frases mais engraçadas (em especial quando combinada com o gesto da mão) e que mais faz sucesso com adultos é o “estou saStifeito!” depois do almoço. com a mãozinha, indicando que não quer mais comida.

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“mamãe, conta a história do pão?” (ou do número 8, ou da nai, ou da folhinha, ou do vovô…) tudo agora ele quer que conte uma história, explique de onde veio, porque veio, pra onde vai. e a gente inventa, ou simplesmente conta mesmo a história das coisas. cem vezes.

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ainda não consegui me acostumar com frases como “isso é muito legal, mamãe” ou “do que a gente vai brincar agora, mamãe?”, “o que é isso, mamãe?” que mostram como ele sabe o que quer, o quer gosta, e convida a fazer algo com ele. são poucos meses ainda de interação verbal (9 meses somente desde o início da fala), e é espantoso como o domínio da língua evolui.

mas no fundo, acho que o que mais me espanta e encanta é que a fala abre uma janela enorme para a mente, o raciocínio da criança, todo um processo que antes acontecia sem que percebêssemos claramente. agora podemos trocar ideias, negociar, interagir muito mais.

sei que a comunicação não-verbal é essencial, e deve permanecer e se desenvolver (inclusive a coisa que mais adoro por enquanto na experiência de ter filhos é o contato físico, sem palavras, que é intenso e lindo), mas esse canal de comunicação verbal é mágico e incrivelmente prazeroso.

Categories: educação · tagarela

família e princípios — essas coisas de antigamente

December 10, 2012 · 4 Comments

hoje no facebook me deparei com 2 artigos que motivaram textos distintos, mas que resolvi juntar por aqui, porque os assuntos são afins: de um lado, mais um programa de TV promovendo o consumismo infantil, para além de quaisquer limites do aceitável; de outro lado um artigo asqueroso de um jornal paranaense afirmando que crianças adotadas por homossexuais não fazem parte de uma família. família = mulher, homem, crianças.

(o título do artigo: a PERVERSÃO da adoção)

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sempre achei criança e o universo infantil um tanto enfadonho, enquanto adulta-e-sem-filhos. via crianças mal educadas e sem noção, e torcia o nariz pra elas. “criança no geral é chato, né?”. depois de ter meu filho e começar a conviver com crianças mais intensamente (a minha e as dos outros) percebi que meu incômodo fora mal direcionado a vida toda. crianças são incríveis (porém MUITO cansativas, isso é real), o problema são SEMPRE os adultos que as cercam, em especial os pais. os adultos ao redor transformam promessas de seres humanos normais em criaturas sem-noção-e-sem-discernimento.

vejam o exemplo do programa de TV: qual adulto empenhado em educar seu filho e transformá-lo num cidadão do mundo atual (redução de consumo, respeito pela diversidade, etc.) entraria nessa onda de “festas milionárias”? aliás, pra quê festas de criança tão consumistas e fora da realidade de 99% do mundo? o que as crianças aprendem, em eventos como esses? e eu sei, esse é o exagero do exagero, mas pensem nas festas “comuns” em buffets, totalmente pasteurizadas, deixando presente no baú da porta. as crianças nem recebem mais os presentes (e os abraços) dos convidados. o afeto deixou de ser foco FAZ TEMPO, virou coleta de presentes, comilança de frituras e uma zona de crianças sem limite, cuidadas por monitores que são pagos pra não estrangular nossos filhos sem noção.

e mesmo com tantos exemplos de “famílias” fazendo besteira atrás de besteira na educação dos seus filhos, procriando feito coelhos e colocando milhares de pessoas no mundo sem a menor preocupação de torná-las serem humanos decentes, o asno do artigo sobre adoção ainda defende a estrutura “familiar tradicional”. sem nenhum medo de errar afirmo que pais adotivos homossexuais e as tais comunidades hippies (ahn?!) serão melhores pais para os seus filhos que estes imbecis das festas milionárias, ou os tantos imbecis que simplesmente colocam crianças no mundo sem nenhum empenho em educá-las.

para se constituir família não é preciso ter filhos, pra começar, meu senhor. há famílias SEM filhos também. não é preciso 1 homem + 1 mulher + crianças. este senhor vive na idade das trevas, assim como seu coração seco e duro, apoiado pelo seu pobre cérebro limitado.

precisamos dar às crianças afeto, tempo, dedicação. dinheiros, coisas, e “famílias margarina” são dispensáveis, secundários e, no limite, irrelevantes.

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tá difícil ser gente decente nesse mundo, é muito difícil criar filhos ensinando valores diferentes destes que aparecem cada dia mais por aí. muita força nessa subida, viu.

Categories: educação · maternidade
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